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[Fanfic] Memórias de uma Sorin

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Maff ~
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Mensagem por Maff ~ Qua Abr 27, 2011 2:18 pm

Nota: Bom, eu já havia começado a postar essa fic no fórum da antiga Milícia, mas acabou que eu não passei do 1° capítulo. x3 Estou me baseando na fanfic "Laboratório de Somatologia", do Akah, e na quest do Martírio do próprio rag, que é bem interessante e diz algumas coisas sobre Margaretha. No mais, essa não é a história verdadeira dela. É, digamos, uma adaptação tensa criada por uma carioca tensa que simplesmente é fascinada por biolabs. *u*

Nota²: Vocês vão perceber que não tem thirds e que os monstros ainda estarão dispostos na formação antiga dos mapas... Isso porque vou tentar seguir a linha cronológica dos acontecimentos mesmo. Críticas construtivas serão sempre bem vindas - aliás, eu necessito delas, porque acho que a fic ainda não está em um nível bom. Pelo amor de Odin, me ajudem x3 *ArchBishop feelings*

Nways... É isso. Espero que gostem.

----------


Se eu fechar meus olhos agora, ainda posso visualizar os campos verdes, de aparência pacífica, abrindo-se e moldando-se sobre aquelas montanhas que desciam e subiam em solavancos; algumas miúdas, outras imensas. Posso sentir o cheiro das flores suntuosas do monte Mjolnir, mesmo que o odor acre tenha feito-me esquecer das belezas do mundo há alguns instantes atrás. Eles estão sorrindo para mim. Todos eles. Mamãe, Cecil, Arthur e a pequena Phoebe. Irmã Cecília, dentre muitos outros cujo rosto aparece-me iluminado com uma aparente alegria. Ao longe, consigo ouvir o pio alto e imponente de Sygnus, planando no céu azul como se tudo aquilo não pertencesse a ninguém menos do que ele.

Mesmo agora, digo que seus rostos estarão para sempre em minhas memórias. O fim não me parece tão doloroso quando penso nas pessoas com quem eu compartilhei um pedaço da minha vida, parece até aceitável. Senhor, sei que te ofendes com o que acabara de ouvir, mas peço que não guarde mágoas de sua fiel serva. A vida ensinou-me que é impossível caminhar sozinha, e cada uma das pessoas citadas em meus minutos finais são, no mínimo, aquelas que eu prezava acima de tudo e de todos. Alguns, infelizmente, encontrarem-Te antes de mim. Agora sou eu quem irei por este caminho. Tenho meu lugar reservado a Teu lado, meu Senhor? Terás piedade de uma pecadora que nada mais fez na vida além de seguir a Tua palavra?

Ah, aquele som novamente. Estremeço. Reverbera de forma tênue, fina, metálica, cortando os ares com extrema frieza. Ele prescindia a dor, eu sabia disso. Em meus breves momentos de lucidez, ele estava lá, encarando-me e refletindo minha própria imagem assustada, desgastada. Aquele mesmo bisturi que nos havia ferido de tantas formas, tanto físicas quanto morais. Por trás dele, a expressão fria de um homem que ousava considerar-se um Deus; um sujeito medíocre que ousava brincar com as vidas que o Senhor criara com tanto afeto, com tanta ternura e paciência...

Consigo ouvir o pranto de Katherine, mas não ouso olhá-la nos olhos pois temo ver mais além do que gostaria; o desespero em seus olhos transpassava suas cavidades oculares e preenchia toda aquela sala. Eles sabiam disso, mas não se importavam. Pobre Katherine... Sinto muito, mas eu não poderia ajudá-la daquela vez. A vida impedira que nossos caminhos fossem cruzados antes, mas aqueles poucos dias – semanas, meses; o tempo já não me fazia sentido – serviram para que nos tornássemos íntimas. Cobaias nas mãos do mesmo homem... Do mesmo monstro. E ver as lágrimas em seus olhos e o desespero em tua face era pior do que sentir aquele bisturi cortando-me a pele, fazendo com que a dor física sobreponha-se à dor moral por alguns breves instantes.

Serás a primeira. Aquele era o adeus silencioso que nos era permitido ter: amarradas, amordaçadas, sem nenhum direito à lutar pela sobrevivência. Era o fim, Katherine, era nosso fim. Eles estão sorrindo para mim. Todos eles. Mamãe, Cecil, Arthur e a pequena Phoebe. Irmã Cecília, dentre muitos outros cujo rosto aparece-me como um borrão. Ao longe, consigo vislumbrar Sygnus, moldado em sua imponência e liberdade, planando alto, muito alto...

Adeus, Katherine. Que Deus lhe abençoe.



Memórias de uma Sorin





Capítulo I: Olhos de Nuvem

Um emaranhado de prata e algodão.

Era assim que o céu se traduzia para mim naquele dia. Um infinito e desconexo emaranhado de algodão, prata, luzes e sombras onde, de forma aleatória e sagaz, claridade e opacidade se embaralhavam em um só. Os tons que lhe pertenciam eram dos mais variados: um cinza fosco, um branco expressivo, um azulado dos mais sutis e que logo seria escondido por mais um montinho de algodão prateado. As nuvens estavam carregadas com chuva, carregadas com trovões, carregadas com incógnitas.

Incógnitas. Incógnitas...

“Tem certeza que você precisa ir?” A voz temerosa de Arthur retirou-me de meu transe de momento. O Noviço tinha as sobrancelhas bem fincadas, com uma ruga de preocupação precipitando-se no vale entre as mesmas. Quando assumia esta expressão ele parecia ter uns cinqüenta anos de idade, mesmo com seu pouco tempo de vida. “Você nunca falta a essas peregrinações, não faz mal não ir desta vez.”

“Não é algo o qual eu possa decidir de forma simples assim, Arthur.” Retirei uma mecha negra que lhe caía à frente dos olhos de mesma cor. As bochechas do Noviço assumiram um tom rubro e vívido. “Nós fizemos um acordo com Odin e com a Catedral de Prontera, lembra? Se não nos encontrarmos com Irmão Bartolomeu pelo final da tarde, estaremos desonrando um contrato sagrado.”

“O que raios esse tal de Irmão Bartolomeu vai falar que não tenha falado para vocês das últimas vezes!?” Sua expressão transmutou-se da preocupação para a raiva. “Você faz essa viagem todos os meses, passa uma semana longe de casa e sempre volta com a mente em frangalhos. Não adianta negar, porque eu sei que é verdade. Aposto que esse Irmão Bartolomeu é uma múmia de quatrocentos milhões de anos que se esqueceram de enterrar.”

Eu ri da forma com a qual Arthur colocou aquelas palavras, mesmo sabendo que aquela expressão seria motivo para se excomungar e castigar qualquer Sacerdote de nossa ordem. A pouca idade de Arthur e suas escolhas lhe faziam imune aos caprichos clérigos com os quais tínhamos que lidar todos os dias: Mesmo sendo oficialmente um Noviço, o jovem era da responsabilidade do Mosteiro ao Leste de Prontera, esforçando-se ao máximo para graduar-se em um Monge poderoso e profissional. Desde recém-nascido eu acompanhava a trajetória do filho de uma de nossas vizinhas, estando tão presente na vida do garoto que acabei por adotá-lo como o irmãozinho birrento que eu não tive a oportunidade de ter.

“Vai chover, sabe.” Ele comentou, estendendo-me um objeto vermelho, com flores pintadas à mão nas cores mais diversos. “Leva contigo. Minha mãe não vai reclamar quando disser que emprestei o guarda-chuva para você.”

Sorri.

“Não estamos cometendo um erro aqui?” Questionei, e sua expressão de dúvida poderia me fazer rir novamente. “Eu é quem tenho que te proteger, lembra? Sou a mais velha.”

“Você é garota, Margaretha. Garotos protegem as garotas, sem falar que esse guarda-chuva cheio de florzinhas ia acabar com a minha reputação em Prontera.”

“Na verdade, acho que ele ficaria muito bem em você. Combina com os seus olhos. Se colocasse um cachecol da mesma cor das flores, ia ficar perfeito.”

Arthur me enviou aquele olhar de você só pode estar brincando que apenas ele conseguia dar. Eu gargalhei e lhe afaguei a cabeleira negra.

“Cuide da mamãe e de Phoebe enquanto eu estiver fora. E cuidar não significa tentar colocar sua irmãzinha em um carrinho de mercadores quando ninguém estiver olhando.”

“Já disse que foi um acidente!” Arthur pareceu realmente emburrado. “Aquela bebê maluca foi engatinhando até o carrinho, não tenho culpa se até as crianças têm desejos ocultos de pegar carona naquelas coisas.”

Ergui as sobrancelhas e sorri, em sinal de desafio. Fisicamente, Arthur tinha quinze anos; mentalmente, eu ainda não consegui descobrir.

“Cuide-se, garoto. E dê um beijo na sua mãe por mim.”

“Não sou eu quem vou ficar uma semana fora de casa para ouvir os ensinamentos de um velho gagá. Quem tem que se cuidar aqui é você, e você sabe muito bem disso.”

“Certo. Então cuide de tudo aqui enquanto eu me cuido lá longe.”

“Pode deixar.”

Dei uma última conferida em minha bolsa, fazendo uma lista mental de tudo o que eu deveria levar. Não me preocupei tanto com os alimentos pois já havíamos feito aquela trilha o suficiente para saber a localização de árvores frutíferas e riachos com água corrente, artefatos que, com certeza, seriam necessários para nós. Artigos de higiene pessoal. Gemas Azuis, garrafas para Água Benta, algumas poções e mudas de roupa. O guarda-chuva florido que Arthur havia me emprestado. Inconscientemente, eu sabia que havia uma foto de mamãe, Arthur, Phoebe e sra. Gisella ao fundo da bolsa.

Aquilo era tudo do que eu precisava.

Despedi-me de Arthur com um aceno de mão, notando-o alternar o peso do corpo entre as pernas. Eu já o conhecia o suficiente para saber que aquele gesto denotava preocupação, mas ele também já deveria me conhecer o suficiente para saber que tudo ficaria bem... Bom, pelo menos em tese. Desde que eu me formara como Sacerdotisa – a uns dois anos, mais ou menos -, eu havia feito estas peregrinações, e em nenhuma delas nós havíamos encontrado tantos problemas.

Afinal, como eles mesmos diziam, o problema deles estava bem abaixo de seus narizes.

Já havia perdido a conta de quantas e quantas vezes minha atenção era chamada por parte de nosso líder, um Sacerdote na casa dos quarenta anos com o cabelo rareando no topo da cabeça. Chamava-se Phillip, era um dos encarregados das aulas práticas dos Noviços que preparavam-se para os testes de Sacerdote e não suportava quando lhe chamavam de “Phill”, mesmo que eu adorasse fazê-lo às escondidas. Phill gostava que tudo saísse na casa dos novecentos por cento de êxito, mesmo quando o cem por cento era o limite de suas expectativas. Não gostava de piadinhas. Não gostava de acidentes. Não suportava que a ordem dos fatores se alterassem, mesmo que, de maneira nenhuma, aquilo alterasse o produto. Basicamente, Phill não me suportava.

O motivo?

Bem, eles diziam que eu era a personificação daquilo tudo.

Acreditem, não era algo do qual eu pudesse controlar. Eu juro por tudo o que há de mais sagrado neste universo – e quando digo tudo, é tudo mesmo – que eu tentava melhorar. Fazia o possível para limpar todas as imagens em gesso dos santos quando estava na Catedral. Estudava com afinco por horas e horas. Meus treinos duravam dias; minhas orações, tardes e noites. Entretanto, parecia haver um ímã que atraía todos os desastres humanamente possíveis – e impossíveis – de serem cometidos para mim. Era Margaretha quem derrubava as imagens e os jarros de flores na Catedral, quem tropeçava nos fiéis durante as missas, quem topava em bancos e quebrava o silêncio quase sepulcral que se instalava nos momentos de oração. Era Margaretha quem confundia os alvos e acabava por conjurar Lex Divina em membros de seu próprio grupo. Era Margaretha a culpada por um bando de Selvagens devastarem um acampamento, só porque decidira passar cinco minutos a mais colhendo flores nos campos.

E eu era Margaretha Sorin.

A maior precursora de catástrofes dos últimos tempos.

Pensar nisso daquela forma fazia-me relembrar da imagem de preocupação que Arthur exibira momentos antes de nossa separação. Mesmo sendo mais jovem, ele sabia que meu jeito desastrado poderia me deixar em sérios apuros algumas vezes. Sendo três anos mais novo e ligeiramente mais infantil, o Noviço portava de algumas atitudes que me deixavam sem saber o que pensar algumas vezes. Como no dia em que eu passara o tempo todo na Catedral e ele aparecera sem ser convidado, ignorando os sermões de Phill e trazendo meu almoço. Ou quando ele saíra embaixo de uma chuva de dar medo em qualquer espectador só porque eu ainda não havia voltado após ser indicada para auxiliar um grupo de aventureiros em Payon. Como hoje, quando me dera o guarda-chuva florido. Eu era a catástrofe ambulante, e Arthur era o jovem novo demais incumbido de detê-la quando ela começasse a se tornar uma ameaça para a humanidade.

Ri sozinha ao pensar no quanto aquilo era irônico.

Mesmo já tendo se passado quinze anos, consigo me recordar de sra. Gisella aos berros pois seu pequeno bebê estava para nascer. Tinha nos olhos aquele quê de desespero e ansiedade, e se não fosse mamãe a levá-la em seu PecoPeco – por sorte, naquela época, mamãe ainda conseguia montar Jessie com perfeição – até a Catedral, não se sabe qual seria o desfecho daquela história. Lembro-me que o céu era de um azul tão puro que perguntava-me onde estariam os artistas para transpassarem aquela cena para um quadro; o céu perfeito, propício para o nascimento de uma nova vida. O pai de Arthur, um Alquimista, estava em uma expedição para pesquisar rochas vulcânicas descobertas em um outro continente, e vi-me sobre um monte de penas alaranjadas, sem entender nada, galopando em direção ao local que, posteriormente, eu chamaria de “meu segundo lar” com muito orgulho.

Aquela fora uma das últimas vezes que mamãe conseguira montar Jessie, antes que fosse gravemente ferida em batalha e adquirisse um ferimento que jamais se curaria com perfeição. Este era um dos pré-requisitos para ser uma Cavaleira: A falta de medo. Não se podia ter medo do que se encontraria no caminho, não se podia temer o desconhecido. E, mesmo que eu seja suspeita para afirmar, Valary não teve medo. Batalhou ferozmente contra tudo e todos que fossem contra a segurança de nossa cidade. Deixou sua vida de lado muitas vezes em batalha, ignorando os riscos e empunhando a espada com maestria. Provou ser capaz de criar uma filha sozinha, após a morte trágica do marido do qual não gostava de recordar. E aí, quando pensava que a vida não podia mais oferecer-lhe obstáculos, os ferimentos causados por um grupo de infratores lhe define o resto da vida: Não poderia mais exercer a função de Cavaleira, pois não mais conseguiria empunhar uma espada ou montar com maestria.

Aquilo lhe derrubara de tal forma que eu pensei que iria perder mamãe mais à frente. A espada era a única forma de deixar mamãe realmente satisfeita, e a depressão que se seguiu após sua recuperação física foi o momento mais delicado que eu passara em minha vida. A sra. Gisella passava os meses em nossa casa, cuidando do pequeno Arthur e de mim como se fôssemos realmente irmãos, como se mamãe fosse realmente de sua família. Naquele momento, mesmo sem eu saber, concretizava-se a união que seria essencial para que todos nós chegássemos onde chegamos. Meses depois, mamãe se recuperara e adotara Jessie como mascote – obviamente, um PecoPeco de montaria era bem mais preparado fisicamente e ligeiramente maior do que um PecoPeco de estimação, mas mamãe não pareceu se importar com isso – e conformou-se com sua atual posição de ex-Cavaleira. Sequer tive coragem para acordá-la e me despedir, já que Valary dormia tão pacificamente em sua cama ao ponto de parecer ser quase um pecado profanar aquele estado. Por sorte consegui me encontrar com Arthur, que saía cedo para seus treinos matinais nos campos de Prontera, e despedi-me de forma que ele informasse mamãe e sra. Gisella sobre tudo. Já não era a primeira vez que eu me encaminhava para uma peregrinação, portanto, não acho que elas devam ficar tão preocupadas. Pelo menos espero.

Encarei mais uma vez a massa prateada e fofa que compunha o céu daquela manhã, tentando discernir alguma forma dentre tantas nuvens que se amontoavam. Nada.

Ou seria eu quem não conseguia discernir o porquê de meu coração parecer aflito daquela vez?

Incógnitas. Muitas incógnitas...

As torres da Catedral de Prontera surgiram em meu horizonte, majestosas e altivas, como se pudessem realmente tocar aquele céu nublado. Daquela vez os sinos não cintilavam pelos raios solares que os beijavam; estavam opacos e silenciosos, como se a manhã houvesse esquecido de despertá-los. Um grupo de três Sacerdotes já aguardava em frente à Catedral, e ao que pude perceber, Phill ainda não havia dado o ar da graça. Uma pena, pensei ironicamente.

O trio ergueu a cabeça quando me aproximei, e acenei amigavelmente para eles. A resposta me veio em um “olá” embargado pelo sono e pela falta de ânimo, o que era de se esperar já que Prontera não parecia ter despertado ainda. Eram poucos os Mercadores que perambulavam pelas ruas, buscando o melhor ponto para suas vendas; nem mesmo as crianças ousavam sair de suas camas para começarem mais um dia de brincadeiras. Éramos apenas os quatro Sacerdotes – três com muito sono, uma considerada uma ameaça para todos os outros -, sentados à frente da Catedral, esperando pacientemente pela boa vontade daquele que era consagrado como nosso líder.

Foi Enya, uma Sacerdotisa de cabelos esverdeados e muito apertados em uma trança, que perguntou:

“Será que seremos apenas nós quatro?”

“Não sei.” Consegui entender as palavras em meio a uma voz masculina muito embargada pelo sono. “Por enquanto só temos nós, mesmo.”

“Talvez eles tenham esquecido.” Pouco provável, respondi mentalmente ao outro que ponderavam. “Ou eles não tenham tido coragem de se levantar da cama.”

“Alguém sabe se o Phill vai demorar?” Ousei perguntar, enfim.

Os três me direcionaram olhares acusadores, e só então percebi a gafe de ter mencionado meu apelido pessoal para o Sacerdote em voz alta.

“Digo, Phillip nunca se atrasa.” Fiz questão de corrigir, e o Sacerdote que respondeu Enya balançou negativamente a cabeça, como se lamentando por meu erro. “Espero que não demore tanto.”

“É.” Enya respondeu ao ver que nenhum dos outros o faria. “Espero mesmo.”

Um silêncio desconfortável instalou-se entre nós sem nem sequer pedir licença, e eu demorei alguns instantes para perceber que eu era a causa dele. Oh, mas era claro que sim. Afinal, quem estaria confortável sabendo que um grupo de quatro Sacerdotes iria passar uma semana acampando em peregrinação e que, dentre eles, estava Margaretha Sorin? Nenhuma pessoa com uma mínima noção de perigo, é óbvio. Pergunto-me no que estariam pensando aqueles três... O que ela fará agora? Colocará fogo no acampamento? Rasgará nossas barracas? Encolhi os ombros, num gesto inconsciente, tentando me focar em qualquer coisa que não fossem aqueles três. O céu acinzentado. A cor escura dos olhos de Arthur. A respiração branda de mamãe enquanto dormia, a cabeleira muito cheia e muito cacheada de sra. Gisella...

“Bom dia, irmãos.” A voz de Phill tirou-me de meus devaneios num susto. “Perdoem-me pela demora, ocorreram alguns imprevistos, mas consegui resolvê-los à tempo. Preparados?”

Os três Sacerdotes assentiram desanimados, e acompanhei seus movimentos enquanto Phill direcionava-me seu melhor olhar inquisitivo. Estaria calculando o tamanho do problema? Ergui o rosto para olhá-lo nos olhos e tentar decifrar seus pensamentos, mas a expressão séria do Sacerdote parecia formar um muro entre mim e suas opiniões.

“Creio que já estão prontos para a viagem.” Assentimos mais uma vez. “Então vamos de uma vez, Irmão Bartolomeu deve estar a nossa espera.”

Eu queria lembrar-lhes de que demoraria um dia inteiro até que chegássemos até os campo onde Irmão Bartolomeu residia, mas resolvi manter-me calada; afinal, já havia estourado minha cota de olhares recriminadores por um dia.

Mal sabia eu que a semana estava apenas começando.




Com quatro horas de viagem, resolvemos parar para estocar algumas frutas e nos alimentarmos. O céu parecia ter escurecido mais ainda, e a tarde que se iniciava era tomada por um cinza escuro, triste demais para que eu possa descrevê-lo. Comparado com o céu da manhã, o punhado de nuvens parecia uma cortina de fumaça negra, como se escapasse de algum ponto onde o fogo tomava conta dos arredores.

Enya e um dos Sacerdotes – Joseph, como ouvi Phill chamá-lo – ficaram responsáveis por procurar frutas e outros tipos de alimentos que nos pudessem ser úteis. Jamais cogitamos a possibilidade de caçar algum monstro das redondezas, mesmo que o outro Sacerdote tenha ficado tentado quando ouviu Enya comentar sobre o guisado de carne de Lunático que havia preparado na noite anterior. Como imaginar uma criaturinha tão dócil, tão meiga sendo cozinhada e ingerida? Mamãe costumava cozinhar carne de Lunático para nossos jantares, mas eu jamais consegui degustá-los. Phill descascava algumas batatas enquanto o Sacerdote que havia permanecia conosco lia um livro de capa escura, dura, do tamanho de uma enciclopédia.

Eu me levantei, ciente de que precisava fazer alguma coisa.

“Vai a algum lugar, Margaretha?” Perguntou o calvo, sequer levantando os olhos para mim.

“Vou... Hm...” Vamos, pense. Vá a algum lugar. “Me disseram, uma vez, que por estes arredores existem Plantas Brilhantes. Vou tentar conseguir algumas ervas para nós.”

Será que Phill era capaz de detectar minhas mentiras?

“Hmmmm...” Seu grunhido mais parecia um pigarro do que qualquer outra coisa. “Está certo. Vamos continuar a viagem daqui a uma hora e meia.”

“Estarei aqui antes disso.” Prometi.

“Claro que estará.”

Fiz questão de me virar e partir antes que o sentido das palavras de Phill adentrasse meu consciente. Eu havia ouvido algum tom irônico em sua voz? Espero sinceramente que não, pois eu pretendia mesmo voltar antes do horário estipulado. Não havia Planta Brilhante nenhuma naquele local, apenas alguns cogumelos vermelhos que ficavam próximos a um lago antes do início do Monte Mjolnir, e eu não estava disposta a ir tão longe assim. Sem falar que os Besouros de Chifre e os Lobos que ali habitavam pareciam ser bem perigosos, mesmo que eu nunca tenha visto um de perto. O jeito era perambular pelos arredores.

Mesmo à distância, eu conseguia sentir o cheiro agradável que as flores do Monte Mjolnir emanavam. Se houvesse algum lugar no mundo mais belo do que aquele lugar, bom, eu não o conhecia. As réplicas feitas em livros das flores gigantes eram tão belas que beiravam o irreal, e imagino como seria passar uma tarde em meio àquelas flores tão lindas, tão gigantes, quase que me embalando em um abraço. Infelizmente, os monstros que lá residiam eram tão perigosos quanto os Lobos dos quais eu havia acabado de comentar, e eu sequer imagino a dor e a dificuldade de curar um ferimento causado pelos ferrões daqueles insetos imensos. Havia lido em algum lugar que o veneno dos Argiopes era um dos mais letais daquela região, podendo matar uma pessoa em questão de minutos.

Andei por alguns minutos sobre a relva baixa, e admito não ter percebido quando algumas árvores adentraram em meu campo de visão. Continuei andando em frente, seguindo uma trilha tortuosa até um local com mais árvores, cujas plantas pareciam mais altas e em maior número. Concluí que era melhor voltar para o acampamento e esperar que Enya e Joseph voltassem de sua missão; virei-me nos calcanhares e pus-me a andar para...

... Para onde, mesmo?

Ah, não. Não, essa não. Quero dizer, era tudo o que eu precisava, não é? Perder-me em plenos arredores de Prontera, com hora marcada e pessoas à minha espera. Nada mais normal para Margaretha Sorin, eu supus, até porque eu era a grande causa dos maiores desastres clérigos já cometidos. Parando para pensar agora, descobri o motivo da ironia na voz de Phill quando permitiu que eu fizesse esta caminhada. Ele sabia que aconteceria algo daquele tipo. E agora, bem, eu estava perdida.

Só para variar um pouco.

Tentei fazer a trilha de volta, mas tudo o que consegui foram árvores e mais árvores em meu caminho. Poderia tentar teleportar-me para o local onde os Sacerdotes estavam acampados, mas o risco de cair em algum local mais distante fez-me desistir da idéia antes mesmo de tê-la completado. Um portal para Prontera deixar-me-ia sã e salva dentro de um local conhecido, mas me faria perder o horário da expedição e Phill não toleraria nenhum tipo de atraso. Minha melhor saída era encontrar o caminho de volta e nunca, jamais, em nenhuma hipótese cogitar outro passeio daquele tipo. Pensando agora, como aquela idéia era absurda. Sair no meio de uma expedição para... Para quê? Não existiam Plantas Brilhantes naquele lugar, mesmo eu tendo me convencido de que encontraria alguma coisa inovadora nos arredores de Prontera. E agora estava perdida, com o tempo e o universo conspirando contra mim e alguém lá em cima rindo de minha falta de competência, com toda a certeza.

Droga.

Fiquei algum tempo andando de um lado para o outro, tentando me lembrar da trilha que havia feito, mas tudo o que consegui foi adentrar mais na mata e não conseguir voltar. O clima, antes frio, agora adquiria um tom ligeiramente úmido, e as plantas largas davam à mata um aspecto intocado, independente. Eu poderia admirar a beleza rústica daquelas plantas, mas no estado de pânico em que eu estava, não conseguia pensar em outra coisa senão no fato de que aquilo era desnecessário demais. Nada melhor do que se perder em meio a um lugar daqueles, não é? Resolvi que, já que a situação estava tão trágica, abrir um portal para Prontera era a opção mais segura, mesmo que denegrisse mais ainda minha imagem perante meus colegas e colocasse um sorrisinho vitorioso nos lábios finos demais de Phill.

Eu tirei uma Gema Azul da bolsa que havia carregado comigo.

E então... Eu ouvi.

De início, o barulho parecia mais com a agonia de um monstro em seus estágios finais. Um Lobo, pensei; talvez tenha se perdido ao fugir de alguém e estivesse ferido demais para voltar para sua alcatéia. Quando parei para prestar mais atenção, pude perceber um suspiro forte, esforçado, quase desesperado. Os grunhidos não eram de um animal, concluí. Eram de uma pessoa.

Enya, talvez.

Adentrei mais ainda na mata, seguindo aquele som pesaroso, e clamei internamente para que eu pudesse encontrar sua fonte. Enya, Joseph ou qualquer um dos outros poderia ter saído para me procurar e perdido-se também. Por mais remota que fosse aquela possibilidade, ainda assim, deveria ser considerada. Eu não ia conseguir encará-los se fosse a culpada por mais um desastre, principalmente um daquele porte. Havia alguém ferido, havia alguém precisando de ajuda e o tempo parecia ser o maior dos obstáculos a serem vencidos. Cambaleei ao tropeçar na raiz de uma árvore, rasguei minhas meias quando precisei passar por dentro de alguns arbustos e senti-me sendo engolida pela floresta à minha volta.

E lá estava ela.

Seu tórax subia e descia com violência, enquanto o ar entrava com dificuldade por seus pulmões. A cabeleira loura estava manchada com sangue e uma substância gosmenta, de um verde-alaranjado de deixar qualquer um com náuseas. Pelas roupas, reconheci uma Caçadora, mas o que me chamou mais a atenção fora sua panturrilha esquerda: Um ferimento grande e profundo, que sangrava de forma intensa e contínua.

Ela olhou para a direção que eu estava, mesmo que eu estivesse oculta atrás de algumas árvores.

“Se vai me matar, anda logo com isso... Porque estou com pressa.” Sua voz era imponente, inflexível; suas palavras saíam com a dificuldade de quem não encontra ar para respirar. “Ainda tenho que encontrar uns colegas no inferno e... Não gosto de deixar ninguém esperando.”

Arregalei os olhos com aquela informação.

“Não temes a morte?” Perguntei, saindo de meu esconderijo improvisado e percebendo o quanto aquela mulher me era semelhante. Se não fosse pelos olhos acinzentados – um cinza cintilante, vívido - e os cabelos mais arrepiados, eu diria que ela era minha sósia.

“E porque... Porque deveria temê-la?” Ergueu a sobrancelha. “Não é como se pudéssemos fugir dela, um dia... Um dia ela vai chegar. Mais tempo, menos tempo, que se fo**...” Deu de ombros, retraindo-se logo após a ação. Deveria estar com muita dor.

Ponderei um pouco com o sentido de sua resposta, mas não havia tempo a perder com minhas suposições.

“Espere, eu vou curá-la.” Comecei a me aproximar, mas ela fuzilou-me com o olhar.

“É veneno de Argiope... Já está em meu organismo. É uma questão de tempo agora...” Sua cabeça pendeu para o lado, em sinal de desistência.

Eu me ajoelhei a seu lado, de forma a ficar à frente do ferimento, analisando-o melhor. Começava a infeccionar, e o sangue coagulado nas bordas dava ao machucado um aspecto mórbido.

“Não é só porque todos vamos morrer um dia que você tem que desistir logo no primeiro impasse.” Comentei, ignorando o olhar confuso que a Caçadora me enviara. Procurei uma Poção Verde dentro de minha bolsa e estendi para ela. “Beba isso, vai conter e eliminar boa parte do veneno de seu organismo.”

Ela ponderou por alguns instantes sobre o que fazer, e seu comentário seguinte tinha um quê de ironia: “E o que diabos é isso...? Capim líquido?”

Ignorei sua pergunta, pegando mais dois frascos de poção – outra verde e uma branca -, despejando a verde em volta e dentro do ferimento. A Caçadora recolheu as pernas em sinal de dor, mas não hesitei em continuar com os primeiros socorros. Coloquei a poção branca de lado por um momento, postando ambas as mãos sobre o ferimento e canalizando energia o suficiente para reconstruir os tecidos danificados no golpe. As presas de um Argiope deveriam ser realmente imensas, concluí. Precisei utilizar mais energia no início, visando alcançar toda a extensão do ferimento, diminuindo quando o mesmo aparentava melhoras. Não sei quanto tempo se passou desde o momento que iniciei o processo de cura – um minuto? Uma hora? Duas? – mas dei-me por satisfeita apenas quando o ferimento adquiriu um tom superficial. Finalmente espalhei um pouco da poção branca sobre o mesmo, fazendo um curativo simples. Eu estava com dificuldades de respirar, então devo ter gasto uma boa parte de minha energia.

“Uau.” Até mesmo o tom de sua voz parecia mais saudável. “Por essa eu não esperava, loirinha.”

Direcionei-lhe um sorriso cansado e permiti-me desabar, sentindo que as pernas demorariam a lembrar quais eram suas funções.

“Foi um ferimento bem profundo. Monte Mjolnir?”

“Olha só, até que não é tão burra.” Alfinetou-me, mas resolvi ignorar. “Aquelas lacraias-centopéias-coisas gigantes me cercaram... Metade delas foi pro saco. A outra quase me fez de almoço.” Sua forma de falar era indireta, a voz envolvendo as palavras de forma despreocupada, debochada. “Só estou preocupada com Sygnus... Não consegui ver para onde ele foi parar. Aposto que está morrendo de saudades de mim.”

“Sygnus?” Perguntei. Os olhos da mulher pareceram cintilar quando mencionei aquele nome.

“É. Meu falcão.” A Caçadora franziu o cenho e me encarou, como se aquela afirmação fosse a mais óbvia do mundo. “Quando o vi da última vez, estava acabando com a raça de um Argos. Eu ia chamá-lo, mas aquele Argiope filho de uma pu** veio com tudo e quase arrancou minha perna fora! Que raiva que me deu daquela coisa! Tudo o que pude fazer foi fugir, porque sou uma ótima Caçadora e tenho uma ótima agilidade. Acabou que deixei minhas Asas de Mosca na bolsa que os Argiopes haviam destruído instantes antes de tudo aquilo acontecer.”

“E você conseguiu correr até aqui?” Arregalei os olhos, realmente surpresa. “Formidável. Eu não teria conseguido chegar nem na metade do caminho.”

“É claro que não. Já quase perdeu a vida só para chegar até aqui.”

Huh?

“O que quer dizer?”

“Ah, não me leve a mal, mas não é difícil saber onde está uma pessoa quando ela é barulhenta demais. Eu conseguia ouvir suas topadas nas árvores de longe, e senti muita pena das samambaias que você amassou quando você tropeçou e caiu por cima delas.” Mas isso já havia acontecido há muito tempo atrás... “Ou quando você se assustou quando me ouviu. Aposto que pensou que era um monstro!”

“Eu estava há muitos metros de você, não tem como você me ouvir daquela distância... Como você conseguiu?”

“Alô? Sou uma Caçadora, esqueceu? Isso é o que Caçadores fazem.”

Ergui as sobrancelhas. Se era isso que Caçadores faziam, porque eu jamais havia visto um com aquele potencial? Quero dizer, ela havia ouvido minha aproximação antes mesmo de eu saber que ela precisava de ajuda. Aquilo não era de se ver todos os dias; oh, não. Entretanto, não era de minha conta. Resolvi calar-me ao vê-la encarar o céu – ou as copas das árvores criavam um muro na frente do céu -, e não precisei acompanhar seu olhar para saber que ele continuava cada vez mais escuro e...

Ah, droga.

“Essa não.” Acabei lamentando-me alto demais, fazendo com que a loura adotasse uma expressão curiosa. “Essa não, essa não... Esqueci completamente da expedição!”

“Expedição?”

“É.” Levei uma das mãos à testa e fechei os olhos, lembrando-me da expressão debochada de Phill. “Todo o mês nós fazemos um tipo de peregrinação para ouvirmos as lições de Irmão Bartolomeu. Ficamos uma semana fora de nossa cidade para isso. Acabou que eu resolvi dar uma volta e me perdi aqui, aí aconteceu isso tudo e eu com certeza estou muito encrencada.”

“E você perde uma semana da sua vida para ouvir histórias de um estranho?”

Eu quase consegui ver Arthur refletido em seus olhos tão cinzas quanto o céu daquele dia.

“Não é um estranho. Irmão Bartolomeu é um homem muito sábio e muito generoso... Sempre nos recebe de braços abertos, mesmo quando está ocupado com seus Aprendizes. O que acontece é que eu só tinha uma hora e meia até nosso grupo partir. Eu até consigo alcançá-los, pois sei onde mora o Irmão, mas eu não faço idéia de como sair deste lugar.”

A loura gargalhou de forma descontraída, e nem parecia ter escapado de uma morte trágica há alguns segundos atrás.

“Eu vou contigo, se quiser. Sabe, para procurar o Sygnus. Ele deve estar morrendo de saudade e preocupação.” Porque eu tinha a impressão de que era o inverso?

“Faria isso por mim?”

“Bom, você acabou de salvar a minha vida. Não se acostume, só estou retribuindo o favor porque sou uma pessoa muito justa.” A última parte de suas palavras parecia conter um misto de ironia e indiferença. “Sem falar que, pelo seu estado, mais um segundo sozinha aqui pode ser fatal. É mais um favor que eu faço a você, e preciso mesmo encontrar meu falcão. Na verdade eu quero mais encontrá-lo do que te tirar daqui, mas vamos unir o útil ao não tão agradável, certo?”

Considerei a afronta como uma crítica construtiva, se é que havia alguma forma de fazê-lo.

“Eu realmente agradeço por sua ajuda. Não sabe o quanto vai me poupar me acompanhando até lá.”

“Como eu disse, não se acostume, pirralha. Estou vendo o lado de Sygnus.”

Sorri. Mesmo com este jeito arisco, aquela garota parecia emanar uma aura diferente dos demais.

“Mas então.” Ela chamou minha atenção quando a ajudei a se levantar, não sabendo o que fazer com a cabeleira dourada suja de sangue e pedaços de insetos. “Qual teu nome, loirinha?”

“Ah, me perdoe pela falta de educação.” De pé, percebi que a Caçadora era um pouco mais baixa do que eu. “Sou Margaretha Sorin, de Prontera.”

“Margaretha Sorin. Nome engraçado.” Um sorriso delineou-se em seus lábios.

Havia uma forma curiosa no jeito como a mulher falava. Mesmo com seu palavreado defensivo e os palavrões em alta, eu não sentia nela uma vontade de realmente afrontar-me. Na verdade, parecia um... Teste. Como se a cada palavra, a cada gesto, a Caçadora estivesse me aplicando um teste; parecido com o que Bispo Tomás me aplicara quando fiz meu teste de Sacerdotisa, entretanto, sem um real motivo para que eu quisesse ter um bom conceito. Os cabelos dourados e arrepiados da mulher me faziam lembrar de dias ensolarados e belos, e seus olhos acinzentados remetiam-me às nuvens pesadas que outrora tomavam os céus. Um contraste claramente irônico, eu diria. Um sol que se esconde por detrás de nuvens.

“A propósito...” Ela começou a retirar os pedaços de insetos que se apoderavam de seu cabelo, tentando adotar o tom informal em sua voz. “Chame-me de Cecil Damon.”

E foi assim que eu conheci Cecil.

A Caçadora dos olhos de nuvem.
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Mensagem por Acer Qua Abr 27, 2011 4:10 pm

Aaaw Mais uma fic para eu acompanhar *-*
Adorei o capítulo :3
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Mensagem por Havoc Qui Abr 28, 2011 10:59 pm

Muito bom o cap. Tem estilo e se revelou bem humorado. Pena que já se sabe o tipo de fim da história =/

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Mensagem por Maff ~ Sáb Abr 30, 2011 8:04 pm

Capítulo curtinho, espero que gostem. x3

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Capítulo II: Cecil Damon

Cecil faria vinte anos em dois meses. Era a segunda de quatro irmãos, todos Caçadores ou Arqueiros. Era alérgica a Mastelas, fluente em palavrões, gostava da sensação de liberdade ao viajar sozinha e não suportava quando lhe diziam o que fazer. Trabalhava como caçadora de recompensas, apesar de ser iniciante naquele ramo, e eu não conseguia imaginá-la perseguindo infratores poderosos ou assassinos. Seus sentidos eram absurdamente aguçados, mesmo que ela dissesse que este era um dom concedido a todos os Caçadores que honrassem seu compromisso com a natureza e com seus instintos. Prezava Sygnus acima de tudo, e o falcão – um belíssimo animal, diga-se de passagem – era um dos maiores e mais bem tratados que eu já havia visto nestes dezessete anos e alguma coisa. Mostrou-se muito surpresa quando eu disse que morava com minha mãe, em Prontera, e empinou o nariz para dizer que isso não lhe era mais um problema há tempos.

“Saí de casa aos quatorze anos.” Confidenciou-me, mas não entrou em detalhes e eu não tive coragem de lhe pedir que me contasse mais.

Tinha uma gargalhada engraçada, alta e exagerada que só era exibida quando eu falava algo absurdo demais para sua realidade – o fato de morar com minha mãe era um deles; o outro fora quando havia comentado sobre o apelido de Phillip, apesar de não ter encontrado tanta graça assim naquela frase -, e eu sequer conseguia medir seus movimentos quando se punha a caçar. Eu lhe disse que havia trago alguma comida de Prontera e que poderíamos pegar algumas frutas para complementar o almoço, mas Cecil insistiu em abater um Lobo que por ali caminhava. Tentei fazê-la desistir da idéia de caçá-lo, mas algo que pude perceber naquelas poucas horas de caminhada era que Cecil parecia se transformar em uma outra pessoa quando empunhava seu arco. Seus olhos adquiriam um brilho diferente, quase como gracioso, em questão de segundos uma flecha cortava os ares com imensa precisão e velocidade.

Cecil era diferente de todos os Caçadores que já haviam cruzado meu caminho.

Aquele fato ficara explícito para mim em apenas algumas horas de viagem.

E, por ser diferente, alguns pontos chegavam a ser até compreensíveis: A ironia e o deboche que implantava em todas as frases possíveis. A falta de paciência. A vontade de alvejar Phill com umas oito milhões de flechas quando finalmente chegamos ao acampamento e vimos que eles haviam continuado sua rota sem mim – por sorte, eu sabia o caminho a ser feito até o Irmão Bartolomeu. O fato de sempre caçoar de qualquer coisa que eu fale, independente de ser boa ou ruim. Sua personalidade era muito forte, muito imprevisível. E, apesar de tudo, eu não conseguia sentir raiva ou impaciência para com a sua forma de agir.

Na verdade, descobri que apreciava sua companhia.

“Já estamos chegando, po**?” Ela perguntou pela enésima vez, revirando os olhos. “Meu estômago já está roncando.”

“Não faz nem uma hora que almoçamos.” Fiz questão de lembrá-la. “E falta pouco para chegarmos.”

“Esse caminho é tão insuportavelmente longo que faz meu estômago confundir raiva com fome. Não vou me surpreender se esse tal de Bartolomeu morar no alto das colinas mais isoladas do mundo, conversando com pedras, árvores e abelhas.”

“Você conversa com um falcão.” Sorri pequenamente com a brincadeira, mas não lhe encarei. “Não é tão diferente assim.”

“Sygnus não é apenas um falcão, é uma das mais belas criaturas de todo esse mundo e não preciso lhe dar mais explicações sobre isso.” Findou as falas. Difamar Sygnus era a única coisa que a Caçadora não aturava.

A noite caía de forma lenta e imperceptível, como um felino que espera pacientemente para dar o bote em sua presa. Eu já não conseguia discernir algumas figuras da floresta, então precisava depender dos olhos precisos de Cecil para me guiar. Dizia para onde ela deveria ir, e quando conseguíamos chegar ao local, dava-lhe mais coordenadas e deparava-me com sua expressão pensativa, talvez enquanto ela traçasse um mapa mental e visualizasse com perfeição o lugar que eu havia descrito. À pouca luz, os olhos cinzentos da Caçadora adquiriam um tom quase negro e misterioso, como se encobrissem alguma verdade que não pudesse ser extravasada. Não sei exatamente o porquê de ter me lembrado de Arthur naquele momento, e gostaria de dizer-lhe que estava tudo bem.

“Acho que já estamos chegando.” Ela encarava o chão, como se conseguisse lê-lo. “Eles passaram por aqui. Consegue ver os rastros?”

Eu assenti, mesmo que não conseguisse ver nada além do chão negro abaixo de nós.

Sygnus não estava conosco. Após encontrá-lo e averiguar se estava tudo bem, Cecil deixou-o livre para caçar naquela região, sempre atenta aos céus caso ele voltasse para “lhe deixar a par de alguma coisa”. Dizia que fazia isso para que suas asas permanecessem fortes e ágeis, e devo admitir que era gratificante vê-lo levantar vôo. Era um falcão enorme, de penas lustrosas e que aparentavam cores diferentes de acordo com a claridade; como se o Sol colorisse suas asas de acordo com a sua vontade. Eu não entendia como Cecil conseguia compreendê-lo, mas parecia realmente haver uma conexão entre aqueles dois, muito maior do que “animal” e “humano”. Pergunto-me se haviam outros Caçadores com aquela habilidade tão formidável e, se sim, onde se escondiam.

“E você tem tido contato com sua família desde que saiu de casa?” Perguntei para quebrar o silêncio.

“Não muito. Não temos o hábito de mandar cartas ou marcar encontros...” Ela pareceu ponderar por um momento. “Só tenho falado com aquele babaca daquele meu irmão, o Ícaro. Às vezes a gente acaba se encontrando por aí, mas só assim, também.”

“Mas você não tem uma casa para ficar? Não sei, algum lugar para onde ir quando não quer mais viajar?”

Mais uma risada exagerada e engraçada para preencher o silêncio da noite.

“Está brincando?” Cecil me olhou nos olhos, talvez procurando pela ironia de minha frase. Ergueu uma das sobrancelhas quando não encontrou. “Eu não conseguiria sobreviver em um lugar fixo, me acostumei com essa vida de lá pra cá. Sem falar que não conseguiria criar Sygnus dentro de uma casa, sabe como é...”

Sygnus. É claro.

“Isso é o de menos.” Sibilei, cruzando os braços à frente do corpo. “A Jessie dá cinco do Sygnus e mora dentro de casa.”

“Jessie?” Ela perguntou.

“É nosso PecoPeco de estimação. Originalmente ela era para montaria da minha mãe, mas tornou-se nossa mascote por motivos de força maior.” Sabia que estava sendo egoísta ao não contar sobre os problemas que mamãe passara ao perder o posto de Cavaleira, já que Cecil havia me contado tanto sobre sua família, mas contar aquela história para outras pessoas ainda era muito complicado para mim. “Ela é um amor. Foi difícil fazê-la se acostumar, no início, mas acabou que ela gostou. E sabe que ela dá um ótimo sofá, às vezes? Deitar sobre as penas dela é muito bom.”

Cecil pareceu pensar sobre aquilo por um momento, mas deu de ombros.

“Quem sabe?” Foi tudo o que ela me disse, e eu não soube exatamente como interpretar aquela questão.

Quem sabe o que ela queria dizer? Quem sabe como vai ser o dia de amanhã? Quem sabe o que pode acontecer no futuro? Haviam tantas formas de interpretar aquilo... Eu gostaria de conhecer mais sobre a Caçadora, mas haviam assuntos dos quais ela parecia não gostar de falar. Aliás, era claro que não gostava. Mal nos conhecíamos, eu já devia considerar muito o fato de saber tanto sobre ela. A loura deveria me achar petulante demais por perguntar com aquela naturalidade de assuntos tão pessoais, assuntos que eu não conversava nem mesmo com as pessoas que eu conhecia há muito tempo. Deveria estar agradecendo por já estarmos chegando à casa de Bartolomeu, apenas para se ver livre de minha presença, e eu agradecia internamente pela noite não me permitir visualizar sua expressão raivosa.

Cecil virou-se para me encarar. “Ôu... Tu gosta de ser uma Sacerdotisa?”

Aquela pergunta pegou-me desprevenida. “Sim.” Assenti, ainda em dúvida de quais seriam suas reais intenções com aquela questão.

“Minha irmã mais nova estava louca para se tornar uma Noviça.” Ela contornou uma árvore, e por um momento eu apenas pude seguir o som de sua voz. “Lia a Bíblia como se a vidinha dela fosse depender disso. Daí meus pais a arrastaram para a Guilda dos Arqueiros e a obrigaram a se tornar uma Arqueira, assim como todo mundo.”

Permaneci calada enquanto ela continuava.

“Eu queria que ela se tornasse uma Sacerdotisa. Quer dizer, tudo bem que vocês se vestem com pano de cortina e rezam novecentas e quarenta horas por dia, mas eu realmente queria que ela se tornasse uma. Você tinha que ver o brilho nos olhos dela quando falava desse tal de Odin, ou das bênçãos que lhe foram dadas por um Noviço aleatório que ela encontrou por aí. Fiquei com pena quando ela se tornou Arqueira. Pena, mesmo.”

“É...” Concordei, sem saber o que falar. “O arco e a flecha devem ser importantes para os seus pais.”

Cecil estalou a língua. “Eu não consigo entender o porquê das pessoas fazerem isso. Sonya só tinha dez anos, aquilo foi maldade. Sem falar que ela tinha o direito de escolher o que queria ser, não?”

Aquilo me fez pensar por um momento.

“Eles te obrigaram a ser Arqueira também, Cecil?”

“O que?” Sua gargalhada preencheu novamente os campos cobertos pela noite. “O Arco me escolheu, pirralha. Eu não ia conseguir ser nada mais do que uma Caçadora. O que seria de Sygnus sem mim? Aliás, me pergunto onde ele está. Faz tempo que não vem me contar as novidades.”

Cecil disse aquilo com a naturalidade de quem espera que uma pessoa lhe traga notícias sobre algo importante. Acima de nós, um céu pontilhado de estrelas abria-se pela imensidão, uma visão que seria impossível de se ver com as luzes de Prontera. A brisa gélida da noite nos acariciava gentilmente, fazendo com que o farfalhar das folhas das árvores fosse o fundo musical perfeito.

“É que você me lembra dela, da Sonya.” Finalmente ela disse, sem olhar-me nos olhos. “Não a vejo desde que se tornou Arqueira, três dias antes de eu sair de casa. Ela seria uma boa Noviça.”

Meu coração se comprimiu em algo pequeno demais para exercer suas funções vitais. Mas é claro. Cecil havia sentido empatia por mim pois eu lembrava sua irmã caçula; eu havia sentido empatia por Cecil porque... Porquê? A resposta não parecia estar em lugar nenhum. A Caçadora era desbocada, abusada, convencida e adorava envenenar suas palavras para me atingir. Entretanto, eu havia, por assim dizer, me acostumado com sua presença. Não me importava com seus inúmeros palavrões ou com o fato estranho de Sygnus ser colocado como um ser falante, pensante e presente em nossos diálogos. Pergunto-me se aquele não era a razão para que Cecil houvesse saído de casa; a revolta deveria ter sido tanta por parte da ação de seus pais que ela não agüentou ficar lá. Ou talvez eu devesse parar de fazer suposições sem fundamento.

Uma claridade fraca chamou minha atenção. Vinha de trás de um arbusto grande, e eu precisei de um tempo para reconhecer aquele lugar. Parecia muito diferente durante o dia, e se não fosse o aroma do ensopado de legumes tradicional de Irmão Bartolomeu, eu não teria reconhecido que havíamos chegado. Cecil colocou ambas as mãos nos quadris e suspirou.

“Encomenda entregue com êxito.” Falou, virando-se para me encarar. “Essa droga desse ensopado está abrindo meu apetite.”

“Porque não janta conosco? O Phill come bastante, então Irmão Bartolomeu sempre faz um caldeirão inteiro deste ensopado.”

“Nããããããããão, eu acabeeeeeei de matar aquele Loooooooobo.” Cecil proferia teatralmente, com a voz fina e melosa, e só então eu percebi que ela estava me imitando. “Relaxa, pirralha. Minha fome não é tanta para eu aturar o seu pessoal, já não me basta você.”

“Elevar a auto-estima alheia é realmente o seu forte.” Caçoei, e ela deu de ombros.

“Pois é, a gente faz o que pode.”

“Bom... Obrigada por me trazer até aqui. Eu não teria conseguido chegar viva se não fosse você.” Fiz uma reverência cordial, que foi recebida com humor pela loura.

“É claro que não ia. Teria virado comida de Lobo há algum tempo atrás, mas eu aceito seu agradecimento.”

“Se precisar de alguma coisa, pode me escrever. Mande a carta para a Catedral de Prontera, eles me entregarão.”

“E porque cara***s eu precisaria escrever para você?” Ergueu as sobrancelhas, mas um sorriso brincalhão desenhava-se em seus lábios. “Consegui me virar até aqui sozinha; se eu precisar morrer eu vou morrer sozinha também, não com uma loura desastrada no meu encalço. Se pelo menos fosse um homem eu até ficaria feliz, mas você...” Cecil levou a mão até a testa, em sinal de pesar.

Gargalhei, tentando manter o clima agradável da conversa. Tenho certeza que o grupo já sabia que eu estava lá, pois ouvi meu nome ser proferido por algum deles – o Sacerdote que eu ainda não sabia o nome, provavelmente. Havia esquecido completamente de Phill e dos outros, e talvez estivessem à minha espera agora.

“A gente se vê, projeto de gente.” Cecil acenou, virando-se nos calcanhares e pondo-se a andar.

“Até mais, Cecil Damon.” Acenei de volta, e a última coisa que vi foram seus cabelos dourados refletindo o brilho da lua.

Ela seguiu seu caminho.

E eu começaria a seguir o meu.
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Mensagem por Acer Dom maio 01, 2011 3:08 am

sahusauhsauhsauhhsausauhsahuuhsa Adorei a Cecil, parece uma carioca -q
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Mensagem por Maff ~ Dom maio 01, 2011 11:18 am

Acer, eu vou considerar isso um elogio só porque eu me diverti bastante escrevendo sobre a Cecil. *Carioca* AEHIAUEIUHAEIUAHEUIAHEAIUEH
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Mensagem por SniperMaizena Dom maio 01, 2011 1:29 pm

Nada mal nem^^
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Mensagem por Zero Dozer Dom maio 08, 2011 10:37 pm

Estou lendo... E atualizando a ficha das duas por sua causa, Maff. XD

Anyways, Cecil tinha três irmãos. Quem era o terceiro?
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Mensagem por Maff ~ Dom maio 15, 2011 1:20 pm

Capítulo III: Pequena Flor


A semana, ao contrário do que eu esperava, arrastara-se tão lenta ao ponto de eu me confundir com a transformação dos minutos em horas e das horas em dias. Se não fosse por Irmão Bartolomeu a me indicar as datas, eu com toda a certeza teria me perdido nesta passagem de tempo tão louca e tão demorada. Lembrei-me de Arthur, contrariado, referindo-se à minha mente em frangalhos todas as vezes que eu voltava para casa empós a peregrinação.

Pela primeira vez em muito tempo, eu era obrigada a concordar com o Noviço.

Desde o momento de minha chegada, os olhares desconfiados e indecifráveis faziam pesar em minhas costas. Não é à toa que meu primeiro pensamento quando contornei aquele arbusto fora sair correndo e encontrar-me novamente com Cecil: A Caçadora era ácida em suas palavras, mas seu olhar era transparente como o mais límpido dos riachos. Aqueles eram obscuros, duvidosos, expressando verdadeiro descontentamento ao verem-me chegar.

Afinal... Eles não estavam esperando por minha volta.

Aquilo era mais do que óbvio.

“Margaretha, até que enfim!” Ouvi a voz de Irmão Bartolomeu me chamar, com genuíno alívio e felicidade. “Estávamos todos preocupados com sua demora. O que houve?”

Eu queria dizer a ele que nem todos estavam tão preocupados assim, mas mantive-me quieta e inexpressiva.

Por insistência de Irmão Bartolomeu, narrei a maior parte de minha aventura enquanto perdida, omitindo apenas a existência de Cecil naquele contexto. Não minto que tive vontade de contar cada pedacinho do ocorrido ao homem, mas eu não confiava nos outros quatro elementos ali presentes, e não gostaria de expor a Caçadora ao conhecimento deles. Ela já tinha problemas demais para lidar com sentimentos tão mesquinhos, concluí rapidamente. Para eles, toda e qualquer pessoa que trocasse mais do que duas palavras comigo sem ser obrigada estava fadado a carregar a maldição de Margaretha Sorin, e mesmo que não me dissessem aquilo em palavras, suas expressões contrariadas me diziam aquilo de forma bem explícita. Tentei não desviar minha atenção do rosto sorridente e pacífico de Bartolomeu, sabendo que, caso o fizesse, quatro pares de orbes tão negros quanto a mais escura das noites estaria me espreitando, como se esperando para abater sua presa em seu momento fatal de descuido. Não era necessário olhar para Phill para perceber o sorriso desgostoso que seus lábios desenhavam, talvez se perguntando o porque de eu não ter voltado para Prontera e, de uma vez por todas, parasse de tentar arruinar suas missões.

Como um Sacerdote, um servo de Deus, era capaz de nutrir tanto rancor?

Foi a pergunta que me fiz durante toda a semana.

Os ensinamentos de Irmão Bartolomeu eram preciosos, como pequenos pedaços de diamantes que se dispunham para a criação de um colar. A paz que aquele homem emanava era indescritível; sua fala era mansa, seus olhos eram gentis, seu rosto era desprovido das rugas de preocupação que era exibida em todas as pessoas que viviam em Prontera. Suas histórias – ah, que histórias! – eram como um oásis em meio ao deserto de Sograt, carregando um turbilhão de esperança e de fé. Ele sorria quando via nosso progresso; ele gargalhava quando contávamos alguma história constrangedora. Quando junto a ele, os momentos de paz eram tão intensos que eu sequer conseguia me lembrar dos problemas que carregava comigo.

Depois disso... Bem, o inferno se seguia.

Enya, Joseph e Cícero haviam se fechado em seu grupinho particular, respondendo-me de forma monossilábica na maioria das vezes. Eu não os culpava, de qualquer jeito. Imagino a quantidade de atrocidades que tenham sido faladas de mim por Phill enquanto estive perdida, sem falar dos boatos que os três com certeza ouviam na Catedral de Prontera. Margaretha, a desastrada. Margaretha, a azarada. Margaretha, aquela que é capaz de por uma missão abaixo. Estavam apenas se protegendo, eu tentei colocar isso em minha cabeça para espantar o sentimento de raiva que tentava se apoderar de mim. Estavam apenas tentando salvar a peregrinação que eu ameaçara arruinar uma vez, e eu não devia sentir raiva deles por isso, era lógico que não. A raiva jamais fora um sentimento saudável, principalmente desmotivada daquela maneira.

Phill, em contrapartida, parecia querer me testar a cada segundo. Chamava-me a atenção caso minhas orações ultrapassassem o volume adequado. Repreendia-me quando eu gaguejava. O simples fato de falar parecia incomodá-lo e fazê-lo encontrar algum motivo para me acusar de mais um erro que, como ele mesmo dizia, eu não era capaz de compreender. Os dias se arrastavam bem devagarinho, como os Fabres que se recolhiam ao fim do dia. Pela primeira vez em todos aqueles anos, eu senti uma necessidade inquietante de arrumar minhas coisas e partir rumo a casa, onde mamãe estaria me esperando com seu maior sorriso de boas-vindas. Talvez aquilo tudo não passasse de uma provação enviada por Odin, no intuito de avaliar se eu era capaz de suportar aquele tipo de pressão.

Só agora, observando a noite silenciosa, é que esta idéia me veio em mente: Uma provação. Sim, definitivamente sim. Apoiada à sacada da varanda, as idéias começavam a surgir como as pequenas estrelinhas que pontilhavam os céus. As formas com as quais nosso Deus agia nem sempre eram claras, mas sempre continham sentido, sempre exalavam veracidade. Se aquilo era uma provação, eu deveria me esforçar para conseguir superá-la. Talvez Phill também me considerasse uma provação a ser vencida, uma forma de conseguir ter sua imagem bem vista aos olhos do Senhor. Se sim, acho que eu deveria me desculpar por dar a ele tantas dores de cabeça. Estávamos aqui apenas para cumprir o propósito de ajudar a quem precisasse, independente do credo, da profissão, da aparência. Todos eram iguais aos olhos de Deus, e a Seu lado retornariam quando lhes fosse a hora. O Senhor era tão bondoso...

“Não acha que está frio aqui fora?” A voz tirou-me de meus devaneios com um susto.

Virei-me na direção do timbre para descobrir um Irmão Bartolomeu muito curioso, com um casaco de tecido pesado em suas mãos e um sorriso de pés-de-galinha no rosto. Entretanto, no ato, consegui sentir meu braço colidindo contra algo sólido, traduzindo-se no som de algo se espatifando no chão logo em seguida, e tudo o que pude concluir fora que eu havia acabado de quebrar um dos vasos de flor que repousava pacificamente sobre a sacada da varanda, aquela mesma onde eu me apoiava a alguns segundos atrás.

Ah, não.

De novo não.

“Droga!” Exaltei-me, descendo o degrau que separava a varanda de Irmão Bartolomeu do resto do mundo e deparando-me com o estrago. A pobre planta – uma mudinha, miúda e frágil -, estava caída em meio a um monte de terra e cacos. “Droga, droga, droga, era só o que me faltava.” Eu ralhava comigo mesma, esquecendo-me por um momento do outro elemento presente na cena. “Desculpe-me, Irmão. Eu sou uma destrambelhada!”

Eu tentava juntar a terra de todas as formas possíveis, preservando a pobre plantinha sobre o monte, de forma a tentar garantir aquela vidinha até encontrar um novo lar para a mesma. De fato, eu não me surpreendia com aquele desastre. Se Phill estivesse me vendo agora – tenho certeza de que ele ouviu o estrondo, mas não o ouvi se manifestando dentro da cabana -, enviar-me-ia aquele olhar de reprovação e impaciência que tanto lhe era característico. Como se já não bastassem os desastres que eu causava na própria Catedral, eu precisava espalhar o caos até mesmo em um local tão pacífico quanto a cabana do Irmão!

Em passos lentos, Bartolomeu aproximou-se de mim e ajoelhou-se a meu lado.

“Você se machucou?” Encarei-o e pisquei duas vezes, confusa com sua pergunta. Ao balançar a cabeça negativamente, ele suspirou aliviado. “Que bom. Esses vasos são bem frágeis, mas ainda assim podem machucar alguém.”

Baixei meu rosto. “Sinto muito, Irmão. Eu sou uma desastrada.”

“Não se desculpe, Margaretha.” Ele ergueu ambas as mãos, encarando o punhado de terra e a planta que eu segurava nas minhas. “Dê-me ela aqui.”

À pouca luz, a expressão de Irmão Bartolomeu era indecifrável. Mesmo sabendo que aquele sentimento não combinava com ele, eu tinha medo de que ele sentisse raiva por ter destruído um de seus vasos. O homem era a personificação do porto seguro ao qual tantas pessoas se referiam, e eu não conseguia sequer imaginá-lo de outra forma a não ser aquela.

Com dificuldade e cuidado para não derrubar o punhado de terra, ele se levantou e afastaram-se alguns metros da varanda, onde algumas plantas pequenas e selvagens descansavam. Eu o segui, acompanhando seus movimentos: cavou um buraco não tão fundo, mas espaçoso o suficiente para abrigar a pequena futura-flor e a terra que lhe servia de lar. A novata parecia alheia a tudo que lhe havia acontecido, e mesmo sendo uma planta, parecia se distinguir das outras espécies que ali se acumulavam.

“Melhor assim, não?” Irmão Bartolomeu perguntou, batendo uma mão na outra para se livrar da terra. “Agora é só esperá-la crescer.”

Eu assenti, sem saber o que dizer.

“Algo lhe incomoda, minha filha?” Ele se ergueu para me encarar, estendendo-me o casaco. “Se for o frio, não se preocupe mais. Este casaco é velho, mas continua exercendo suas funções de forma magnífica.”

Sorri, agradecendo-o. A bondade que aquele homem exalava era quase inacreditável.

“Agora me conte o que preocupa tanto sua alma, Margaretha.”

“Deus.” Disse, por fim. “Por mais que eu tente, não consigo entender o que ele quer de mim.”

O sorriso divertido de Irmão Bartolomeu aumentou, como se ele estivesse feliz por eu ter feito aquela afirmação e gargalhando internamente por alguma piada que eu não sabia terminar.

“Ninguém consegue entender, Margaretha. As ações Dele não costumam ser claras, mas são sempre coerentes e sempre atuam para o nosso bem.”

“É que...” Apertei o casaco em minhas mãos, não sabendo ao certo como colocar aquilo em palavras. “Eu sou sempre a problemática, se é que o senhor me entende. Veja bem, eu quase coloquei a expedição à perder semana passada. Por mais que eu tente, eu não consigo cumprir o que o Phillip me pede de forma que ele se orgulhe de mim. Estou sempre tentando contornar meus limites, mas eles parecem tão mais fortes do que eu... Será que isso não é nenhuma forma Dele me testar? E se Ele estiver realmente me testando, como farei para superar isso e prová-Lo que sou digna de minha fé?”

A expressão divertida de Irmão Bartolomeu se suavizou. “Margaretha... Já ouviu a frase ‘Deus escreve certo por linhas tortas?’”

Sim, eu concordei mentalmente. Quando assenti, o homem suspirou.

“A vontade divina é algo que, mesmo com muito tempo de estudo, jamais será decifrada. Muitas coisas podem não parecer certas para você, mas, com o tempo, verás que elas fazem mais sentido do que realmente aparentam. Eu pude ver a forma com a qual Phillip te tratou ao longo desta semana, e vejo seus esforços para progredir, isso me orgulha em muito, minha filha... Mas esta cobrança a qual você mesma se impõe está lhe cegando.”

Não compreendi o que ele havia dito, então deixei que continuasse.

“Veja este pequena muda, por exemplo.” Olhei de soslaio para o punhado de terra revolvida, onde a mudinha repousava pacificamente. “Por um longo tempo, esta planta vai destoar do contexto de todas as outras. Suas folhas irão crescer grandes demais, ou seu caule não seguirá os padrões das outras, ou sua cor será diferente, dentre tantas outras diferenças que lhe acompanharão durante toda a sua vida. Mas, nem por isso, ela irá perder a sua beleza. Quando adulta, ela irá chamar tanta atenção quanto as outras belíssimas flores que a circundam, senão mais, afinal, ela vai ser a diferente. Uma pessoa que acompanhasse seu florescimento, de início, diria que ocorrera um erro grosseiro àquela flor pertencer ao conjunto que pertencia; mas ao vê-la tão bela, tão segura de si, ele perceberia que nem tudo ocorre da maneira que queremos, mas tudo tem um significado. Por isso, Margaretha, não se atenha às diferenças ou às crenças de quem lhe diz para desistir. Floresça como esta pequena muda irá florescer um dia, torne-se aquela que se diferencia de todas as pessoas à sua volta; não por sua beleza, mas por não ter medo de ser o que é. E verá que Deus, com Suas linhas tortas e Seus meios incompreensíveis, irá reservar o melhor futuro possível para você.”

Eu o encarei, ciente de que meu rosto havia perdido toda e qualquer cor que um dia houvesse tido. Não só meu rosto: Todas as cores que um dia se acumularam em mim pareciam fugir, deixando apenas o vazio, o nada, de forma que aquelas palavras pudessem tomar todo o meu ser e exercer seu sentido. Eu pensava em milhões de coisas mas, ao mesmo tempo, não conseguia chegar a nenhuma conclusão. Irmão Bartolomeu me fitava com um sorriso satisfeito, como se aquela reação fosse exatamente a que ele esperava.

Como poderia existir naquele mundo criatura tão sábia, tão fascinante? As palavras que o homem usara foram talhadas em minha mente, reverberando por todo o meu corpo, absorvendo seus significados de forma desigual. Sim, desigual; minha cabeça parecia leve, desprovida de problemas, mas minhas pernas pareciam que iriam desabar em qualquer momento, no menor e mais fraco dos sopros. Em minhas costas pareciam ter se aberto asas de anjo, prontas para levantarem vôo e me tirarem daquele lugar, mas meu coração palpitava tão intensamente que suspeitei que Bartolomeu pudesse ouvir suas batidas desenfreadas dentro de meu peito. Era como se o mundo houvesse perdido todo o seu sentido, mas ao mesmo tempo, fizesse todo o sentido que poderia haver.

“Eu...” Respire, Margaretha. Pense. Lembre-se do que dizer. “... Obrigada, Irmão... Eu...”

“... Ainda está morrendo de frio e não colocou o casaco.” Irmão Bartolomeu tomou o agasalho de minhas mãos e jogou-o em minhas costas, empurrando-me enquanto eu ainda tentava me lembrar de qual era a função de minhas pernas. “Vamos para dentro antes que pegue um resfriado! Precisa estar com boa disposição para a viagem de volta a Prontera amanhã, como conseguirá percorrer aquela distância toda se estiver doente, hein?”

Não estava frio, eu queria lhe dizer. Pelo menos não tanto ao ponto de eu precisar me agasalhar daquela forma... Mas, por um momento, eu pude perceber o quanto as palavras pareciam desnecessárias. Tudo o que deveria ser dito havia chegado a mim da forma mais inesperada possível, em uma comparação pouco provável e de uma forma que, em todas as suas pontas soltas, encaixava-se perfeitamente. Havia uma linha tênue entre a realidade e o mundo dos sonhos, e tenho para mim que Irmão Bartolomeu conseguia chegar ao máximo de cada um dos dois sem arrebentá-la. O mundo estaria lotado de pessoas tão gentis, tão sábias, ou eu deveria considerar-me uma felizarda por ter compartilhado de pelo menos algumas semanas da vida daquele homem? Uma bênção de Odin para mim? Para o mundo? Era difícil interpretar. Afinal, por mais que eu tentasse, a vontade divina era tão ou mais transparente do que a mais espessa das brumas, tão clara quanto a mais escura das noites.

E, no entanto, ainda havia luz.

Como uma pequena flor que brota em meio ao nada.




“Você se alimentou direito?”

Eu assenti, contrariada.

“Escovou os dentes depois de cada refeição?”

Sim.

“Rezou direitinho? Aquele tal de Phillip sei-lá-das-quantas brigou contigo?”

“Mãe...” Tentei pedir para que parasse, mas foi em vão.

“Os outros Sacerdotes judiaram de você? Oh, minha pobre Margaretha, sempre tão incompreendida!” A Cavaleira assumiu um ar teatral e exagerado, agarrando-se ao pescoço de Jessie como quem se apóia na própria morte. “Que mundo cruel, que mundo vil... Se eu pudesse, eu esquartejaria todos os malfeitores para que minha filhinha ficasse sã e salva.” Valary, agora, segurava o grande e colorido bico do PecoPeco, obrigando-a a olhá-la nos olhos. “Vocês não foram atacados por nenhum grupo de Arruaceiros, não é? Eu adoraria ir atrás deles apenas para vingar o ataque que-“

“Mãe, por Odin, tenha piedade.” Eu levei ambas as mãos ao rosto, em sinal de desistência. “Está tudo bem. A peregrinação foi ótima, não houve nenhum imprevisto...” Apenas o meu passeio que acabara, acidentalmente, durando tempo demais. Mas isso era assunto para outras conversas. “Só me diga o que aconteceu de novo em Prontera enquanto eu estava fora.”

Ela pareceu ponderar um pouco. “Bom... Nada de tão interessante. Quero dizer, o Soldado Caio confessou seu amor avassalador para a funcionária Kafra Denise, mas ninguém esperava que ela fosse casada. O pobrezinho está arrasado... Tenho levado um prato de comida para tentar alegrá-lo, mas ele parece tão abatido... Ah, o amor, sempre tão lindo, mas sempre tão doloroso.”

“Hm...” Eu não sabia exatamente o que dizer. “O que mais?”

“Anitta acabou criando uma confusão desnecessária no centro de Prontera por ter adotado um Orc. Até mesmo a cavalaria foi acionada, mas nada que um pouco de conversa não resolvesse... Eu, é claro, estava lá para amenizar a situação. Porque está me olhando assim? Posso não exercer mais a função de Cavaleira, mas as lutas estão no meu sangue, Margaretha. No mais... Arthur foi para aquela abadia sei-lá-das-quantas para se graduar como Monge, e eu não faço idéia de quando volta. Gisella está tão preocupada... Acho que vou aproveitar e fazer um pouco mais de sopa hoje, assim posso dividi-la com Caio e Gisella...”

Espera um pouco.

“Arthur? Monge?” A expressão de confusão tomou o rosto de Valary empós minhas perguntas. “Não está um pouco cedo para ele se formar?”

“Cedo está, meu bem. Mas eu sempre soube que aquele menino tinha potencial, ah, como soube! Ele está um ano adiantado, mas tenho certeza que ele vai se dar muito bem. Não é, Jessie?”

Como resposta, o PecoPeco piou e bateu suas pequenas asas, fazendo com que um sorriso animado surgisse no rosto de mamãe. Era engraçado ver a cumplicidade que as duas haviam criado ao longo dos anos; até mesmo eu, em alguns momentos, conversava com Jessie como se ela fosse compreender minhas frases e respondê-las. Entretanto, algo mais urgente tomava conta de meus pensamentos, e não necessariamente tinha a ver com o PecoPeco de montaria que morava em nossa casa, mas sim com aquele que estava longe demais dela: Arthur. Eu sabia que ele era inteligente, esforçado e até centrado demais para a sua idade, mas eu não conseguia me acostumar com a idéia de que ele estava em um lugar desconhecido, sozinho, preparando-se para enfrentar o mundo de forma tão prematura. A maioria das pessoas só conseguia se graduar em uma segunda classe entre os dezesseis ou dezessete anos, e imagino que um jovem com apenas quinze não seria tão bem recebido quanto os outros. O Noviço, desde sempre, fora considerado um irmão para mim. Não conseguia imaginá-lo passando por alguma situação desconfortável e, o pior, sem ter-me por perto para ajudá-lo.

“Eu vou preparar o almoço.” Valary retirou uma mecha de cabelo de meu rosto, fitando-me com um sorriso cúmplice. “Não se preocupe com o Arthur, certo? Ele sabe se cuidar. Quer dizer, ele sempre dá um voto de confiança em você quando você vai para essas peregrinações malucas com aquele tal de Phillip... Dê um crédito ao menino também, certo? Logo, logo, ele vai estar de volta.”

“Ce-Certo... Obrigada, mãe.”

A Cavaleira deu uma piscadela, que evidenciou as rugas que começavam a se formar no canto de seus olhos, e partiu para a cozinha. Agora éramos apenas Jessie e eu.

Era incrível a quantidade de coisas que poderiam se suceder em apenas sessenta minutos. Neste pequeno intervalo de tempo, meu humor já havia oscilado entre muitos estados – a alegria de estar novamente próxima à família e o alívio de ter conseguido suportar uma semana tão massante. A euforia em ver mamãe novamente. Uma sensação de esmagador conforto em tomar banho quente mais uma vez. A preocupação que a notícia sobre Arthur me fizera ter. Uma hora era tempo o suficiente para que sua mente pudesse dar a volta ao mundo, mas era muito pouco tempo para que eu pudesse organizar todos estes pensamentos de uma maneira que eles não me deixassem louca.

Jessie parecia ter captado minha preocupação. Levantou-se, destrambelhada, e sentou-se novamente ao meu lado, onde permiti que meu corpo caísse e afundasse no mar de penas macias e quentinhas do PecoPeco. Comecei a acariciá-la, pelo menos para demonstrar que tudo ficaria bem, e Jessie deitou a cabeça em meu colo, ocupando grande parte do espaço livre apenas com seu bico enorme e colorido. Em alguns minutos, estaria dormindo. Aquela era a reação que tínhamos desde que me entendo por gente, e algumas vezes eu me questionava sobre haver lugar melhor no mundo se não imersa nas penas de um PecoPeco. Fechei os olhos por um momento, logo perdendo essa noção do que me era consciente e do que me era inconsciente, permitindo que meu corpo acompanhasse o movimento brando que Jessie fazia ao respirar.

Em alguns segundos, eu também havia pegado no sono.




Mamãe não me acordou para almoçar, então precisei me virar com o pouco de sopa fria que havia sobrado na panela. Nem ela e nem Jessie – que sempre conseguia se levantar sem me acordar, fato que eu jamais consegui descobrir como acontecia - estavam em casa, o que significava que haviam ido levar comida para o Soldado desiludido cujo nome eu não me recordo e para a sra. Gisella. Almocei, mesmo que sem nenhuma fome, e resolvi me banhar e passar na Catedral para orar por Arthur, por sra. Gisella, Phoebe e por todos os outros que precisavam de uma luz em suas vidas.

Naquele momento, parando para relembrar de alguns fatos, pude perceber uma sutil diferença na tonalidade do céu. Mesmo que ainda permeado de nuvens, o firmamento exibia delicados tons de um azul claríssimo, cintilante, quase como se fosse o verdadeiro fornecedor de luz daquele mundo. Um punhado de nuvens pontilhado de azul celeste, como quem pega giz de cera e rabisca de anil uma folha em branco. Ainda fazia frio, mas só pelo fato de o Sol estar se revelando por trás das nuvens, eu me sentia mais aquecida. Até o final da tarde, metade daquelas nuvens se dissipariam e, no dia seguinte, um céu límpido daria o ar de sua graça.

Pensei em Arthur. O que o Noviço estaria fazendo agora? Por mais que soubesse que ele estaria bem, eu não conseguiria parar de me preocupar enquanto ele não estivesse na minha frente, com seu cabelo muito negro e desgrenhado e sua expressão emburrada, independente de ter conseguido se graduar como Monge ou não. Ele só tinha quinze anos, eu repetia mentalmente. Sei que eu poderia estar exagerando em me preocupar daquela forma, mas mesmo assim, era impossível que eu me tranqüilizasse enquanto não ouvisse de sua própria boca que ele estava bem. Era meu irmãozinho, afinal de contas. O mesmo sangue não circulava por nossas veias, mas o mesmo sentimento de cumplicidade morava em nossos corações.

Entrei ligeiramente trôpega na Catedral de Prontera, tomando cuidado para não esbarrar em nada e em ninguém. Não que houvesse tantas pessoas; a missa só se iniciaria às seis da tarde, então eram poucos os cardeais que por ali circulavam. No entanto, eu não queria dar mais motivos para que Phill me olhasse torto quando cruzasse meu caminho. Conformei-me em me benzer e, silenciosamente, dirigir-me até o banco mais próximo do altar, onde duas Noviças oravam como se o mundo dependesse daquele gesto. Lembrei-me de meus tempos como uma Noviça, naquela mesma situação, ansiando a cada dia mais para ter a capacidade de fazer deste mundo um lugar melhor. Arthur adorava questionar-me sobre o porquê de não estar treinando minha força física, e até eu convencê-lo de que Sacerdotes e Monges não eram a mesma coisa, apesar de terem bases ligeiramente iguais, ele persistia na idéia de que um mundo melhor só seria possível baseando-se na força física para defender aqueles que se amam.

Foi quando eu estava me preparando para iniciar minhas orações que senti uma mão pousando em meu ombro.

“Margaretha?” Eu reconhecia aquela voz. Era irmã Cecília.

Virei-me para encará-la, cumprimentando-lhe com o máximo de educação que eu poderia ter. “Pois não, irmã?”

Ela puxou um pequeno envelope de dentro de sua bolsa e o estendeu para mim. “Esta carta chegou ontem para você.”

Peguei a carta de suas pequenas mãos, tomando o cuidado para não amassá-la. Como se alguma força do além me impedisse, eu não consegui entender a caligrafia corrida e sem forma que se encontrava à frente da carta. Seria um engano?

“Obrigada, Irmã Cecília. Que Deus lhe abençoe.”

“Que Deus lhe abençoe, Margaretha.” Ela sorriu e virou-se, voltando a seus afazeres e me deixando sozinha com a carta e com meus pensamentos.

Tive que aproximar o envelope do rosto para conseguir assimilar qualquer coisa. A carta era enviada de Al de Baran, a cidade que fazia fronteira com Rune Midgard e a República de Schwartwald, o último lugar sendo conhecido por mim apenas com base em livros e fotografias. A caligrafia era muito rabiscada, oscilando de tamanho e de forma, e eu quase imaginei uma pessoa fazendo muita força com a pena para escrever aquele endereço. Ao que pude perceber, meu nome também estava escrito errado, o “h” de Margaretha transmutando-se miraculosamente em um “t”. Novamente, pensei ter sido um engano. Não era de meu conhecimento nenhuma Margaretta circulando pela Catedral, e mesmo analisando a carta para encontrar os evidentes sinais do engano, algo dentro de mim dizia que aquele envelope havia chegado ao seu real destino.

Eu só consegui assimilar aquela novidade alguns minutos depois, quando a caligrafia começou a se tornar reconhecível empós tantas tentativas frustradas.

Aquela carta fora enviada por Cecil.
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Mensagem por Len-chan Seg maio 30, 2011 3:34 pm

Maffuxa! *-*

Estou lendo a sua fic, e me divertindo muito com ela. <3 Sua Margherita me lembra a minha Kyrie, era fofa que nem um anjo, mas um dos chars da Momo matou ela, então ela não existe mais \o/

Ah, e Pecopecos são legais. Ler esse tipo de coisa me dá até vontade de escrever também. *olhando sem jeito pro Sven e o Saffron no cantinho da Rescue me*

Só por favor, publique logo um outro capítulo, quero me desfazer o quanto antes dessa impressão meio yurizada que a Cecil e a Margherita me deram... *calafrio*
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Mensagem por Maff ~ Seg maio 30, 2011 9:23 pm

Len. *u* Obrigada pelos elogios. E eu meio que sabia que você ia ter essa impressão, viu? HAIUEHAUIEHAEUIAHE

Talvez eu demore um pouco pra postar outro capítulo porque minha vida aqui anda complicada, mas eu já comecei a escrevê-lo. D: Tenha calma, aiai. E obrigada de noovo <3 ~
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Mensagem por Len-chan Ter maio 31, 2011 9:50 am

Maff ~ escreveu:E eu meio que sabia que você ia ter essa impressão, viu? HAIUEHAUIEHAEUIAHE

Isso, digam que eu sou uma fanática por relações homoeróticas. u_u

Aguardarei pacientemente :3~
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Mensagem por Zero Dozer Qui Jun 09, 2011 11:15 am

Demorou, mas eu dei uma lida no capítulo 3. Bem, ao que entendi, a fic começa um bom tempo antes da Guerra Civil. Com a garota ainda adolescente. Vejamos como a fic rola.

Aguardando o próximo capítulo.
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